Um novo capítulo no design colecionável brasileiro

Foto: Victoria Yamagata & Lari Kreilli
Local: Aalvo Gallery
Palavras: Anita Goes & Lola Maria Tulle
São Paulo, 2025

A ideia da Aalvo tomou forma em 2022, durante um momento de ruptura e renovação na trajetória de Lola Maria Tulle.

Descortinando o universo do mobiliário brasileiro de meados do século quase por acaso—como quem se vê dentro de um cômodo lindamente iluminado, sem uma saída evidente, Lola a princípio, foi cativada pela elegância das peças esquecidas, pela clareza das linhas, pelo peso da herança. Mas, com o tempo, percebeu que essa era uma narrativa já contada, ecoada por muitas vozes antes dela. O que passou a atraí-la foram as histórias ainda não escritas.

Quando entrei pela primeira vez na Galeria Aalvo, no bairro da Barra Funda, em São Paulo, não pude deixar de me perguntar se os visitantes da The Downtown Gallery tiveram a mesma sensação ao cruzar suas portas em 1926. Aquele espaço pioneiro no Lower Manhattan, fundado por Edith Halpert—também uma mulher—transformou o mundo da arte. Assim como a visão de Edith foi um catalisador para novas possibilidades, a Galeria Aalvo de Tulle representa um momento singular de dedicação a talentos emergentes. Lola e Edith compartilham mais do que o gênero—compartilham uma missão enraizada no compromisso profundo de oferecer aos artistas um espaço para crescer, ao mesmo tempo em que os ajudam a sustentar e desenvolver suas carreiras. Ambas movidas pelo desejo de serem mais do que curadoras de arte; são guardiãs do seu futuro.

Hoje, todos os artistas e designers representados por Lola realizaram sua primeira exposição individual na Aalvo. Para ela, talvez esse seja o aspecto mais poderoso de seu trabalho—construir algo com os artistas, do zero, em um espírito de colaboração, confiança e respeito mútuo. Essa abordagem coletiva está no cerne da filosofia da Aalvo e é um testemunho da comunidade que Lola construiu dentro da galeria.

O caminho de Tulle até o mundo da arte foi tudo menos convencional. Ela passou muitos anos imersa na indústria da moda—navegando por sua engrenagem complexa e superfícies polidas. Essa experiência aguçou seu olhar, refinou sua atenção aos detalhes e lhe deu uma compreensão profunda da estética. Com o tempo, no entanto, ela superou esse universo. A moda ensina a ver; a arte, por sua vez, ensina a sentir. Foi essa transição do olhar superficial para a conexão profunda que guiou Lola em direção ao mundo da arte e do design.

“Uma vez ouvi de um galerista que admiro profundamente a seguinte frase: ‘A melhor parte de ter uma galeria é testemunhar a liberdade dos artistas com quem você trabalha — em todos os sentidos da palavra.’ Esse sentimento me marcou desde então, porque é absolutamente verdadeiro. Não há nada mais gratificante do que ver um artista evoluir — não apenas em sua obra, mas também em sua linguagem, sua visão e em sua vida. É um privilégio acompanhar esse crescimento e transformação, e, sem dúvida, é o aspecto mais recompensador do que fazemos.”

Sem formação acadêmica formal no universo do mobiliário, Lola trilhou seu próprio caminho guiada por uma mistura de intuição, curiosidade e experiência prática. Aprendeu fazendo, tropeçando, insistindo naquilo em que acreditava. Essa abordagem não convencional lhe permitiu abraçar uma liberdade que muitos, inseridos em trajetórias mais tradicionais, talvez nunca experimentem. É justamente essa libertação das convenções que tornou seu percurso não apenas mais sinuoso, mas também mais experimental e, em última instância, mais expansivo.

Os artistas mais contemporâneos da Aalvo — Pedro Ávila, Jacque Faus, Andrew de Freitas, Bruno Grizzo e Rafael Triboli — trazem consigo o mérito singular do design aplicado. Embora suas criações sejam reconhecidas como arte, elas carregam também um “fator vivo”: são objetos e móveis pensados para existir no ambiente doméstico sem perder seu peso poético e conceitual. Você pode receber amigos em uma mesa de jantar de Triboli, iluminar sua sala com uma luminária de Ávila ou Grizzo, admirar os vasos cerâmicos esculturais de Faus ou sentar em uma cadeira de Freitas — tudo isso enquanto estabelece com cada peça uma relação profundamente emocional e sensorial.

“No Brasil, o conceito de ‘designer representado por uma galeria’ ainda é relativamente novo e pouco familiar. Estamos ajudando a formar um movimento que redefine não apenas o que significa colecionar, mas também o que pode ser colecionado. Apoiar uma carreira criativa vai além da curadoria: é um compromisso de longo prazo, uma presença constante e — acima de tudo — a construção de uma rede sólida de colecionadores, um processo que se desenrola com o tempo e com a confiança.”

Aalvo Gallery: @aalvogallery // www.aalvogallery.com
Lola Maria Tulle: @lolamaria
Victoria Yamagata: @victoriayamagata

Ao entrar em seu terceiro ano, é admirável ver o reconhecimento que o trabalho da Aalvo vem alcançando. A galeria tem se dedicado a posicionar seus artistas em mercados consolidados — enquanto cultiva, no Brasil, o que chama de “o novo colecionável”. Abrir esse espaço foi tão desafiador quanto transformador em termos de crescimento pessoal.

No fundo, a Aalvo é um exercício de acreditar naquilo que ainda está tomando forma — uma plataforma para o que ainda não tem nome, mas já pulsa, já está vivo e em movimento.