É na alquimia medieval que se começa a utilizar o termo afinidade para explicar a atração e a fusão entre elementos químicos. A afinidade, assim, é a força em virtude da qual duas substâncias diversas “se procuram, se unem e se encontram”. Posteriormente, o termo afinidade foi utilizado por escritores e teóricos, como Goethe e Weber, como metáfora para designar aspectos sociais, e até mesmo espirituais, com conotações de escolha recíproca, atração e combinação.
Acho interessante pensar o conceito de afinidade em ambos aspectos, pois a seleção das obras que compõem a mostra se dá a partir dos artistas que figuraram na última edição da art dialogues, e que a cada lançamento apresenta uma curadoria de artistas em torno de uma temática que guia todos os diálogos da revista.
Se afinidade já era um conceito inerente às conversas propostas pela art dialogues, observar a transposição dessas trocas para um espaço físico me fez realizar que tais afinidades se mostraram muito mais potentes quando justapostas nas duas salas expositivas.
Primeiro porque a exposição possui uma gestualidade muito presente. É nítida a percepção da mão do artista em cada obra. Mãos, inclusive, que aparecem literalmente nas obras de Gabriella Garcia e Regina Parra. Embora as obras pareçam estar em extrema oposição: inteligência artificial versus pintura à óleo, há um lugar instigante onde elas se encontram, que é questionar hierárquicas de poder e controle na perspectiva da história tida como oficial.
João Livra e Mano Penalva, que estabelecem um diálogo na revista, na exposição estabelecem um outro tipo de conversa, uma vez que as obras de ambos artistas trazem objetos de uso cotidiano para uma discussão de arte contemporânea. Se ambos artistas olham para a função desses objetos e subvertem suas lógicas, podemos dizer que Andrew de Freitas, Pedro Ávila e Rafael Triboli parecem fazer um caminho contrário. Os designers emprestam um olhar da arte para exatamente questionar forma e função, criando objetos que que borram as barreiras entre design e arte.
Se essas afinidades vão se estabelecendo nas tentativas de aproximar discursos que parecem antagônicos, é no trabalho de Jacqueline Faus que essa máxima acontece. A cerâmica que serve de base para um pensamento da pintura. Um vaso que não tem um compromisso com a função. Design que serve de base para arte contemporânea, que nesse momento também serve para questionar limites da história e como aprendemos a ver certos objetos. E como muitas vezes é complexo deslocar o sentido das coisas a partir de tudo que aprendemos.
Do escuro, eu via o infinito é um título poético que parte do desejo de pensar essas afinidades que surgem de lugares não imaginados e todas possibilidades de encontro e diálogos que podem surgir a partir dessa união. Eu poderia aqui citar tantas outras afinidades possíveis entre as obras dos artistas, mas o desejo é que esse texto não ofereça tantos caminhos delimitados para possíveis leituras, mas que sejam infinitas as possibilidades interpretativas.
Carollina Lauriano
(1983, São Paulo. Vive e trabalha em São Paulo)
É formada em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo. Tem extensão em Pesquisa em arte, design e moda pela Central Saint Martins/ual, atuando como curadora independente desde 2017. Em suas pesquisas, interessa discutir formas poéticas de habitar o mundo, a partir de uma perspectiva de gênero, étnico-racial e identitária, interseccionando esses temas com uma agenda decolonial ecológica, a fim de impulsionar ações para a construção de um futuro sustentável, recriando novas formas de sociabilidade e reconfigurando as relações de poder.
Dentre os principais projetos realizados estão as exposições “Corpo além do corpo”, que discutia corpo queer e a transexualidade feminina e a busca pelo protagonismo de novos corpos na sociedade e “A noite não adormecerá jamais nos olhos nossos”, na Galeria Baró, primeira exposição a reunir 20 artistas racializadas em uma galeria comercial para apresentar e discutir a produção de corpos dissidentes dentro do mercado de arte.
Entre 2018 e 2020 atuou como gestora do Ateliê397, um dos principais espaços independentes de arte de São Paulo. Em 2021, coordenou o programa da residência artística da Usina Luis Maluf. Atuou como curadora adjunta da 13ª. edição da Bienal do Mercosul, mostra que aconteceu em Porto Alegre em 2022 e é curadora do Projeto Expresso e Refúgio, que oferece formação artística ampliada para jovens adolescentes egressos da Fundação Casa. Tem textos críticos publicados em sites e revistas como Terremoto (Cidade do México) e seLecT (São Paulo).
To know more about Carollina Lauriano: @carollinalauriano
Carollina Lauriano
(1983, São Paulo. Vive e trabalha em São Paulo)
É formada em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo. Tem extensão em Pesquisa em arte, design e moda pela Central Saint Martins/ual, atuando como curadora independente desde 2017. Em suas pesquisas, interessa discutir formas poéticas de habitar o mundo, a partir de uma perspectiva de gênero, étnico-racial e identitária, interseccionando esses temas com uma agenda decolonial ecológica, a fim de impulsionar ações para a construção de um futuro sustentável, recriando novas formas de sociabilidade e reconfigurando as relações de poder.
Dentre os principais projetos realizados estão as exposições “Corpo além do corpo”, que discutia corpo queer e a transexualidade feminina e a busca pelo protagonismo de novos corpos na sociedade e “A noite não adormecerá jamais nos olhos nossos”, na Galeria Baró, primeira exposição a reunir 20 artistas racializadas em uma galeria comercial para apresentar e discutir a produção de corpos dissidentes dentro do mercado de arte.
Entre 2018 e 2020 atuou como gestora do Ateliê397, um dos principais espaços independentes de arte de São Paulo. Em 2021, coordenou o programa da residência artística da Usina Luis Maluf. Atuou como curadora adjunta da 13ª. edição da Bienal do Mercosul, mostra que aconteceu em Porto Alegre em 2022 e é curadora do Projeto Expresso e Refúgio, que oferece formação artística ampliada para jovens adolescentes egressos da Fundação Casa. Tem textos críticos publicados em sites e revistas como Terremoto (Cidade do México) e seLecT (São Paulo).
Para saber mais sobre Carollina Lauriano: @carollinalauriano